Quais empresas usam tecnologia para aliviar efeitos no ecossistema?
Novas tecnologias ajudam a reduzir desperdĂcios e a monitorar ĂĄreas de desmatamento;
Utilizada hĂĄ centenas de anos, sistemas de agrofloresta ajudam a recuperar o solo;
Uso da terra deve aliar interesses econĂŽmicos e ambientalistas para ser bem sucedido.
Com as consequĂȘncias das mudanças climĂĄticas se mostrando cada vez mais aparentes nos Ășltimos anos, ambientalistas, governos e consumidores vem cobrando das entidades produtivas da economia soluçÔes para mitigar os danos ambientais causados por suas atividades.
Um dos setores mais cobrados, especialmente no Brasil, Ă© o setor da agropecuĂĄria, que deve distribuir sua atenção entre alimentar os mercados internos e externos, e garantir que suas açÔes nĂŁo causem prejuĂzos ao meio ambiente. Por conta disso, as grandes empresas da ĂĄrea vem buscando implementar mudanças em todas suas etapas de produção.
A Marfrig e a Cargill, duas das maiores empresas brasileiras especializadas na produção agropecuåria, jå vem hå alguns anos alterando seus processos internos para orientar suas pråticas para este novo mundo, que demanda das empresas uma maior responsabilidade social.
Dentre as mudanças estĂŁo a busca por estabelecer uma cadeia de fornecimento livre de desmatamento, reduzir o gasto de ĂĄgua, a geração de resĂduos e melhorar a reciclagem de suas embalagens.
A Cargill, por exemplo, oferece a seus produtores de soja a possibilidade de entrar no Programa 3S, auxiliando a produção do agricultor em troca do cumprimento de requisitos ambientais, trabalhistas, de saĂșde e segurança. Desenvolvido em 2010 pela Cargill e pelo Instituto BioSistĂȘmico (IBS), a ideia Ă© promover boas prĂĄticas agrĂcolas de sustentabilidade enquanto oferece soluçÔes para os problemas do produtor.
Uma das grandes novidades da Cargill é a criação do aplicativo do 3S, que leva para a palma da mão do fazendeiro diagnósticos e planos de ação personalizados. Em troca, a Cargill avança no seus esforços de oferecer no mercado um produto com menor impacto ambiental.
Segundo os próprios dados da empresa, entre 2019 e 2020 o volume de soja certificada do programa aumentou em 75%. A meta é que em 2030 100% da cadeia de suprimentos da empresa esteja livre de desmatamentos. A empresa também realiza o mapeamento de 100% das åreas fornecedoras de soja na região do Matopiba (Maranhão, Tocantins, Piauà e Bahia), responsåvel por 11% da soja produzida no Brasil. Desse modo, ela visa garantir o cumprimento de seu objetivo para 2030.
Jå a Marfrig também vem realizando um trabalho similar para alcançar uma cadeia livre de desmatamento. A empresa estima que até 2025 toda sua cadeia amazÎnica esteja livre de desmatamento, enquanto até 2030 esse objetivo também seja alcançado nos demais biomas brasileiros.
AtravĂ©s de mapeamentos realizados pelo Visipec e outras ferramentas, a empresa consegue visualizar um monitoramento da sua cadeia de fornecimento de bovinos. Essas informaçÔes sĂŁo cruzadas com informaçÔes sobre ĂĄreas desmatadas e em conflito para estabelecer um monitoramento do desmatamento mais eficiente. AlĂ©m disso, a empresa tambĂ©m definiu objetivos de redução de consumo de ĂĄgua para seus operadores, considerando a disponibilidade hĂdrica de cada regiĂŁo.
A Marfrig também criou o selo Viva! para cortes de Carne Carbono Neutro (CCN), produzidos sob o sistema Integração Lavoura Pasto Floresta (ILPF), modelo de produção agropecuåria bastante difundido pela Embrapa como forma de trazer maior sustentabilidade para a pråtica. Segundo a estatal, o ILPF além permitir uma criação normal do gado, ajuda a recuperar os nutrientes do solo, aumenta o bem-estar dos animais e protege a biodiversidade.
O modelo de Integração Ă© conhecido por aumentar, como um todo, a capacidade produtiva do produtor, que nĂŁo fica tĂŁo dependente economicamente do gado, mas consegue tambĂ©m recursos advindos da produção de grĂŁos, fibras, produtos madeireiros e nĂŁo madeireiros. O ILPF Ă© apenas uma das muitas tĂ©cnicas disponĂveis para os agricultores e pecuaristas de sistemas agroflorestais, conhecidos por conciliar a rentabilidade econĂŽmica e a proteção da biodiversidade local.
Modelos agroflorestais, ou SAFs
Enquanto grandes empresas buscam aliar os mais recentes desenvolvimentos tecnolĂłgicos e digitais para tentar minimizar seus impactos no meio ambiente, um outro paradigma de produção agrĂcola vem hĂĄ milhares de anos aliando a produção e a restauração ambiental: os sistemas agroflorestais, ou SAFs.
Diferenciado pelo seu modo de uso e ocupação do solo, onde os cultivos agrĂcolas sĂŁo plantados lado a lado com espĂ©cies forrageiras e ĂĄrvores, os sistemas agroflorestais trazem um grande nĂșmero de benefĂcios tanto para o solo quanto para o produtor.
O produtor, por exemplo, tem acesso a uma renda mais estĂĄvel podendo aliar plantaçÔes que vĂŁo gerar rendimentos no curto, mĂ©dio e longo prazo. Professor e pesquisador da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, da USP, Ciro Abbud Righi afirma que as possibilidades de plantaçÔes sobre esse sistema sĂŁo inĂșmeras, tendo jĂĄ visto agroflorestas com mais de 150 espĂ©cies diferentes.
O plantio de diferentes espĂ©cies ainda traz melhorias para o meio ambiente, permitindo um maior depĂłsito de nutrientes no solo, o crescimento de raĂzes mais profundas e uma melhor cobertura vegetal, o que previne a erosĂŁo do solo. No entanto, ressalta Ciro, a coexistĂȘncia dessas diferentes espĂ©cies tambĂ©m demanda outros tipos de cuidados que o agricultor deverĂĄ ter, desde como realizar bons pareamentos atĂ© o manejo e a colheita. "NĂŁo Ă© tĂŁo simples passar uma colhedora quando se tem uma ĂĄrvores no meio da plantação".
Os SAFs tambĂ©m sĂŁo capazes de gerar um maior retorno econĂŽmico por ĂĄrea, dependendo das espĂ©cies plantadas. No mesmo metro quadrado Ă© possĂvel ter mais de uma planta ocupando o mesmo espaço, diferentemente de um plantio de monocultura extensa, onde uma soja ou um milho nĂŁo podem ficar tĂŁo prĂłximos assim para nĂŁo competirem por luz solar e nutrientes do solo.
No entanto, por produção total o sistema agroflorestal por definição não compete com uma agricultura mais tradicional. "Em um terreno dedicado à plantação de soja terå uma produção maior de soja do que em um com diversas espécies, é claro".
A adoção de sistemas agroflorestais jĂĄ Ă© uma realidade no Brasil, sendo adotada por milhares ao redor do paĂs, como agricultores familiares e organizaçÔes de movimentos sociais como o MST. SĂł na AmazĂŽnia, a Aliança pela Restauração da AmazĂŽnia identificou mais de 1.600 iniciativas desse gĂȘnero, que alĂ©m de realizarem o plantio, ajudam a restaurar espĂ©cies nativas da regiĂŁo.
Ciro destaca que, apesar das esperanças de restauração da mata original e preservação da biodiversidade dos ambientalistas, as SAFs ainda devem seguir uma lógica voltada para a produção. "De nada adianta uma årea biodiversa, mas sem produzir alimento e riqueza para a população. à lindo, mas os interesses econÎmicos vão passar por cima disso rapidamente".