Como cobrir Donald Trump para não repetir os erros do passado
A exibição de mentiras e insultos de Donald Trump no horário nobre da TV americana gerou uma onda de críticas à rede de TV CNN, enquanto veículos de comunicação voltavam a discutir como deve ser a cobertura do líder republicano, que tentará voltar à Casa Branca no ano que vem.
O "town hall", como é conhecida a sabatina de um político por eleitores, marcou o retorno de Trump à emissora que criticava e da qual estava ausente desde 2016.
Os telespectadores assistiram ao mesmo Trump de sempre. O candidato favorito das primárias republicanas respondeu perguntas de um público fiel, que aplaudiu muitas de suas mentiras e insultos, enquanto a moderadora, Kaitlan Collins, estrela em ascensão na emissora, tentou fazer com que o magnata dissesse o que fará se chegar à Casa Branca em relação a temas como aborto e guerra na Ucrânia, e se ele irá respeitar o resultado das eleições de 2024.
Trump voltou a afirmar, sem provas, como lembrou Kaitlan, que a eleição presidencial de 2020 foi fraudada, e que é a favor da anistia de alguns apoiadores condenados pelo ataque de 6 de janeiro de 2021 ao Capitólio.
A aparição do ex-presidente na CNN ocorreu um dia após ele ter sido condenado por um júri de Nova York a pagar US$ 5 milhões (R$ 24,7 milhões) em danos à ex-colunista da revista "Elle" E. Jean Carroll, que o acusou de estuprá-la no provador de uma loja de departamentos de Manhattan, em 1996. Trump repetiu veementemente suas negativas e chamou E. Jean Carroll de louca.
O presidente da CNN, Chris Licht, defendeu a decisão da emissora de transmitir ao vivo a sabatina, que teve 3,2 milhões de espectadores, mais do que seus concorrentes imediatos no segmento de TV por assinatura juntos.
“Todos nós sabemos que cobrir Donald Trump é pesado e complicado, e continuará sendo”, disse Licht, “mas é o nosso trabalho”. "Sem dúvida, acho que o que fizemos ontem à noite foi um grande serviço aos Estados Unidos. As pessoas acordaram sabendo o que está em jogo nestas eleições de uma forma que não sabiam na véspera".
Em nota, o canal considerou que Kaitlan "ilustrou o que é ser um jornalista de primeira linha", fazendo "perguntas difíceis e reveladoras". “Acompanhou e verificou os fatos em tempo real, para dar aos eleitores informações cruciais sobre as posições do presidente Trump, que está concorrendo (nas primárias para) a eleição de 2024 como favorito republicano”.
- 'Mentir funciona' -
A enxurrada de críticas, no entanto, não demorou a chegar. E apenas começou o debate na imprensa a respeito da cobertura sobre o magnata para que não se repitam os erros da campanha presidencial de 2016, quando ele chegou à Casa Branca.
"Comprovado novamente: mentir ao vivo funciona", disse Mark Lukasiewicz, decano da Faculdade de Comunicação da Universidade de Hofstra, que defende que as emissoras evitem que Trump apareça ao vivo, como tanto gosta. "Quando você traz alguém que irá mentir, desinformar e dizer coisas ofensivas ou misóginas, a CNN não presta nenhum serviço à sua audiência".
“Podemos entrevistá-lo e divulgar trechos que condizem com os fatos, ou checar os que não", a fim de "não confundir a audiência ao ponto que não saiba o que é mentira e sinta que não pode confiar em ninguém", sugeriu Lukasiewicz.
As críticas não vieram apenas das fileiras democratas.
"É difícil presenciar como serviu aos Estados Unidos o show de mentiras transmitido pela CNN na noite desta quarta-feira", escreveu em seu blog Olivier Darcy, jornalista da emissora encarregado de cobrir a mídia.
"Ao longo da noite, Trump ignorou repetidamente Kaitlan ou levantou a voz enquanto despejava no país uma enxurrada de desinformação, na qual parte do Partido Republicano continua acreditando", acrescentou.
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