Extensão do auxílio emergencial vira dilema para Bolsonaro sair da lona
Na contramão do país, Morro do Agudo de Goiás, município de 2.232 habitantes do interior goiano, registrou aumento de 683% no estoque de emprego formal desde o início da pandemia. Na localidade, que fica a 201 quilômetros da capital, Goiânia, quase metade da população (48,2%) recebia o auxílio emergencial.
Morro do Agudo é exemplo de um fenômeno observado pelos repórteres Thiago Resende e Bruno Boghossian a partir de dados dos ministérios da Economia, da Cidadania e do IBGE e publicado nesta segunda-feira na Folha de S.Paulo. O levantamento mostra que os municípios com melhores resultados na geração de empregos com carteira assinada durante a pandemia são justamente os que tiveram maior cobertura do programa.
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Siga o Yahoo Notícias no InstagramDas 500 cidades com melhor desempenho no mercado formal de trabalho, 357 têm mais beneficiários do programa do que a média nacional, segundo a reportagem.
Os números dão a dimensão da dificuldade que o governo terá em alavancar a economia e, consequentemente, sua popularidade, sem o auxílio emergencial em um momento em que os casos de morte e contaminação voltam a explodir e as medidas de restrição social se tornam inevitáveis.
Com o dinheiro do auxílio, muitas famílias conseguiram garantir a sobrevivência ao longo da crise sanitária. Mais que isso, ajudaram a dinamizar a economia em suas cidades, principalmente no interior.
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Por demérito próprio, o governo Bolsonaro iniciou um ano tendo de lidar com UTIs lotadas, falta de oxigênio em hospitais e uma série de travas para colocar em campo um grande plano de vacinação em massa. Enquanto outros países caminham para a normalidade, por aqui economistas já começam a rever para baixo as projeções do desempenho econômico para o ano.
A extensão da crise sanitária, agravada pelo negacionismo do presidente, colocou o governo diante de uma escolha de vida ou morte. De um lado, seguir a cartilha do mercado, hoje uma das âncoras de apoio do presidente que já começa a ser assombrado pela palavra “impeachment”. De outro, encontrar meios para prorrogar um benefício que sempre apresentou como temporário.
A escolha da segunda opção pode balançar os pilares da expectativa do mercado em torno do teto de gastos. Nos veículos especializados noticia-se a palavra “temor” para descrever a expectativa de investidores em relação à prorrogação do auxílio. A equipe econômica desconversa. Seus representantes avaliam que a explosão de casos de contaminação é pontual, resultante das festas e aglomerações do fim de ano, e que não vai alterar as projeções da retomada. Poucos querem pagar pra ver.
Neste momento, para Bolsonaro, seguir as recomendações do mercado significa ver sua popularidade sangrar um pouco mais a cada dia.
Pesquisa Datafolha divulgada no fim de semana mostrou que chega a 40% o número de brasileiros que consideram seu governo ruim ou péssimo (era de 32% em dezembro). Já os que aprovam a gestão caíram de 37% para 31%. Não é uma queda drástica, mas deveria ligar o sinal de alerta.
A rejeição a Bolsonaro cresceu dez pontos percentuais entre os que recebiam o auxílio emergencial que o governo pretende deixar de pagar. Entre os que recebem até dois salários mínimos, a popularidade do presidente caiu oito pontos --isso após aumentar 15% desde o início do programa. A rejeição cresceu 13%. No Nordeste, os que avaliam o governo como ruim ou péssimo somam agora 43% -- eram 34% nos tempos de auxílio.
A esta altura do campeonato, apenas 19% dizem sempre confiar nas palavras do presidente, menos da metade daqueles que dizem nunca confiar nele (41%). Fica evidente que a Bolsonaro só conseguiu vitaminar a popularidade e atravessar a crise com a expansão do auxílio, que chegou a R$ 600 por pressão do Congresso.
Sem o benefício, Bolsonaro é um presidente vulnerável que não consegue sair da lona ao explicar por que sua diplomacia priorizou as botinadas infantis contra parceiros comerciais em vez de enfrentar a crise sanitária como deveria.
Fora daqui, os países que já começaram a vacinação serão os primeiros a visualizar uma certa normalidade na pista da economia. Por aqui, falta oxigênio nos hospitais.