Apostas em default dos EUA com retorno de 2.400% ganham terreno
(Bloomberg) -- Em um segmento tradicionalmente moribundo de Wall Street, especuladores fazem uma aposta que antes parecia impensável: que o governo dos EUA não vai pagar sua dívida e entrar em default.
Com o Departamento do Tesouro cada vez mais perto de ficar sem fundos — a maioria das estimativas aponta mais alguns meses para que isso ocorra — cresce a negociação de derivativos, conhecidos como credit default swaps (CDS). O valor vinculado aos contratos, que vão recompensar investidores caso os EUA atrasem qualquer pagamento, multiplicou por oito desde o início do ano.
Esta não é a primeira vez que a aposta causa uma febre entre investidores. Houve casos semelhantes em 2011, 2013 e, em menor grau, em 2021. Mas, desta vez, tudo parece um pouco diferente. Por um lado, há uma chance maior de atraso nos pagamentos. A polarização em Washington agora é tão extrema que não há garantia de que republicanos e democratas possam intermediar um acordo para elevar o teto da dívida a tempo de evitar uma crise.
E há um atrativo extra para especuladores. Uma peculiaridade no mercado de derivativos indica que podem tirar proveito dos preços baixíssimos dos títulos americanos de longo prazo para aumentar os ganhos com os contratos, caso os EUA realmente não paguem a dívida. Com alguns Treasuries negociados recentemente abaixo de 60 centavos de dólar — resultado da rápida série de aumentos dos juros pelo Federal Reserve — o potencial retorno pode superar 2.400%, de acordo com cálculos da Bloomberg.
“Em Washington, as pessoas acreditam que existe cerca de 30% de probabilidade de isso acontecer e, em Wall Street, as pessoas acham que vai de zero a 5% (a chance) de que isso não seja resolvido”, disse em entrevista Boaz Weinstein, diretor de investimentos do hedge fund Saba Capital Management, com ativos de US$ 4,3 bilhões.
Pode ser difícil imaginar a possibilidade de um default dos EUA. O país nunca deixou de pagar suas dívidas, e a santidade da credibilidade do governo americano é um pilar do sistema financeiro global. Afinal, os Treasuries são comumente considerados como o ativo “livre de risco” — usados para determinar o custo do capital no mundo todo.
No entanto, investidores em Wall Street, apesar de terem visto essa crise fabricada ser resolvida repetidas vezes nos últimos anos, voltam a ficar nervosos.
O spread dos CDS de um ano, os contratos mais buscados para apostar em um default, subiu nos últimos dias, atingindo um recorde de 1,75 ponto percentual na quinta-feira, de acordo com os preços da ICE Data Services rastreados desde 2007.
Dito de outra forma, custa US$ 17.500 para proteger US$ 1 milhão em dívidas dos EUA contra um default por um ano (na verdade, o contrato é precificado em euros). Esse valor se multiplicou por 10 desde o início de 2023 e se compara a menos de US$ 400 na Alemanha.
Essa tensão também é visível no mercado de títulos do Tesouro dos EUA. Investidores agora exigem rendimentos mais altos para notas que venceriam na época de um possível default para compensar o risco de não serem pagos, mesmo que por pouco tempo.
Subadra Rajappa, chefe de estratégia de juros dos EUA no Société Générale, diz que, embora o aumento dos spreads de CDS não sinalize necessariamente que os EUA tenham maior probabilidade de default, “é uma indicação do ambiente político em que estamos” e da possibilidade de uma estratégia arriscada levada até o limite.
--Com a colaboração de Hema Parmar e Tasos Vossos.
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